O amor sem fronteiras das Mães de Haia

A cada ano cresce o número de mães brasileiras que se veem afastadas dos seus filhos, em decorrência de relacionamentos abusivos com pais estrangeiros, muitas vezes marcados com violência doméstica.

Em ato de desespero e no instinto de sobrevivência, para se manterem vivas e protegerem os seus filhos de um lar violento, essas mães retornam ao Brasil com os filhos menores, contudo, sem obter a devida autorização a anuência do genitor para regressar com os filhos ao seu país de origem.

É neste momento que os pais – antes no papel de agressores da história – denunciam as mães por sequestro internacional de menores, se colocando no lugar de vítimas, respaldados por um Tratado Internacional, chamado Convenção de Haia (detalhado a seguir).

O final dessas histórias, infelizmente, costuma ser doloroso: a perda da guarda dos menores e o afastamento das mães de seus filhos, com a determinação de retorno ao país em que residem o genitor.

 

E por que isso acontece?

 

O Brasil é signatário, desde 2000, de um Tratado Internacional chamado Convenção de Haia sobre os Aspectos Civis do Sequestro Internacional de Crianças, criada em 1980, ou seja, assinado há 45 anos.

Esse tratado estabelece que a mudança da residência habitual de menores só pode ocorrer com o consentimento de ambos os pais, pois, caso contrário, pode ser considerado sequestro internacional de menores.

O objetivo da Convenção é proteger menores de 16 anos contra os danos causados pela transferência ou retenção ilícita em outro país, de modo que o país signatário que recebe a denúncia (“país requerido”) tem a obrigação de determinar o retorno imediato da criança ao país de residência original, em respeito ao princípio do retorno imediato, previsto nos artigos 1º, 7º e 12 da Convenção.

 

Na época de sua criação, o tratado buscava evitar que um dos pais retirasse a criança do país sem autorização, como forma de retaliação após o fim do relacionamento. Inclusive, quando a Convenção foi aprovada, a maioria dos casos de subtração de menores era cometida pelos homens, que como vingança de um divórcio e com a guarda da mãe, fugiam com os menores.

 

O fato é que a Convenção parou no tempo e, desde a sua criação, não acompanhou as novas realidades sociais, sem, portanto, considerar contextos de violência doméstica, que muitas vezes são a real motivação para que estas mães deixem o país com seus filhos.

 

Embora o tratado preveja algumas exceções, como os casos em que (i) o genitor não exercia a guarda e (ii) o retorno representa risco físico ou psicológico à criança, ou de qualquer outro modo que a coloque em situação intolerável, previstas no art. 13, alínea ’b’, da Convenção de Haia, a violência contra a mãe raramente é reconhecida como fator de risco, mesmo com as evidências de que a exposição da criança à violência doméstica causa sérios danos emocionais, além de representar potencial risco à integridade física, psíquica e moral do menor.

Essa é justamente a luta do grupo das conhecidas “Mães de Haia”, grupo formado por mulheres que perderam a guarda dos filhos após decisões baseadas no tratado. Elas pedem a modernização da Convenção, exigindo que a violência doméstica seja reconhecida como fator de risco à criança.

 

Movimentações legislativas e judiciais

Atualmente, tramita no Senado Federal o Projeto de Lei nº 565/2022; já no Supremo Tribunal Federal, a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 7.686/DF, que busca reconhecer como situação de grave risco a exposição de crianças e adolescentes à violência doméstica no exterior, sendo possível evitar o retorno da criança ao país estrangeiro, dando-se uma interpretação mais ampla do art. 13, alínea ’b’, da Convenção de Haia.

Esses movimentos representam um passo importante para que a Convenção volte a cumprir seu verdadeiro papel: proteger as crianças e não amparar agressores.

Espera-se que a história mude o rumo e, finalmente, as Mães de Haia obtenham um tratado aliado aos interesses e proteções da família e, portanto, que nenhuma fronteira seja capaz de separar o amor de uma mãe por seu filho.

 

Publicações relacionadas

Mercado global tem novas exigências sobre commodities de risco florestal

(Imagem: Paul Hilton) A preocupação com o menor impacto de risco florestal na aquisição das commodities tem ampliado a discussão, de grandes mercados do mundo, sobre a importância da criação de leis que exijam a garantia por parte dos importadores de que os produtos não têm relação com desmatamento e outros impactos ambientais. Com estas novas políticas e adequações, o reflexo será sentido por todos os envolvidos com cadeias de commodities de risco florestal, desde o pequeno ao grande empresário. O nosso advogado da área…

Caso Ana Hickmann: o que acontece quando seus bens são penhorados?

Juliana Raffo, da nossa equipe de Contencioso Cível, explicou ao UOL os impactos da penhora de bens em casos de inadimplência, como o que envolve a apresentadora Ana Hickmann, cuja remuneração foi bloqueada pela Justiça de São Paulo no último dia 4 de abril. ⠀ Segundo a especialista, penhora é o primeiro passo processual para garantir o pagamento de uma dívida, um bloqueio do patrimônio. A medida pode recair sobre dinheiro, imóveis, veículos ou outros bens, respeitando uma ordem legal. ⠀ A reportagem explica, ademais,…

Briganti Advogados palestra em webinar da XP Investimentos: Impactos da Reforma Tributária no Planejamento Patrimonial e Sucessório

Nesta semana, Gustavo Degelo, sócio da área tributária, e Samantha Teresa Berard Jorge, head do Family Office, participaram de um webinar com Dandara Piani e Paulo Godinho, da XP Investimentos. A apresentação abordou os impactos da Reforma Tributária e as estratégias mais eficazes para o planejamento da sucessão patrimonial. Um conteúdo valioso para todos que buscam segurança jurídica e financeira. Agradecemos a XP Investimentos e aos participantes pelo excelente diálogo!